ABC - terça-feira , 7 de maio de 2024

Como criar uma ‘cidade verde’ em nove anos

Uma cidadezinha no noroeste da Alemanha, com apenas 7.200 habitantes, em um ambiente mais rural, tem um slogan nada modesto para o seu tamanho: se coloca como a cidade onde o futuro já chegou, ao menos do ponto de vista energético-climático.

Saerbeck, na região de Nordrhein-Westphalen, é um desses exemplos de quando o poder público e a comunidade se juntam sob o mesmo objetivo. Em nove anos, a cidade passou de quase zero para uma produção de energia a partir de fontes renováveis que hoje responde pelo dobro da necessidade local. Um parque de bioenergia produz a partir de turbinas eólicas, painéis solares e biogás da decomposição de resíduos. Casas e prédios colocaram tetos solares e um sistema central e integrado de aquecimento, movido com pallet de madeira, substituiu o uso de gás natural.

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A reportagem visitou a cidade em meio à 23.ª Conferência do Clima da ONU, realizada em Bonn, que fica a duas horas de Saerbeck, e encerrada ontem.

Ali, a mudança começou em 2008, quando um concurso foi aberto na região em busca de projetos para desenvolver a “Municipalidade Climática do Futuro”. Saerbeck se empenhou em pensar em um plano de ação para zerar suas emissões de carbono até 2030 e ganhou a competição, com € 1 milhão de incentivo.

“Analisamos onde estávamos, para onde queríamos ir, onde estaríamos no futuro e o que poderíamos fazer para aumentar a nossa fatia de renováveis. As metas de zerar CO2 eram para 2030, mas já em 2013 alcançamos esse resultado ao menos no que se refere à eletricidade”, conta o prefeito Wilfried Roos. Foi o pontapé para dar início a uma série de projetos pensados com a comunidade, que propôs ideias e participou das discussões e execução de cada um dos sete campos definidos. “O objetivo era fazer dos cidadãos parte do projeto.”

Da munição ao sol

A população foi questionada, por exemplo, se teria interesse em ter a própria casa transformada em uma produtora de energia e funcionar com maior eficiência energética. Logo de início, 25% das famílias disseram que gostariam de participar. Entre 2009 e 2014, 440 unidades fotovoltaicas foram instaladas no telhado de casas, e também de escolas e fazendas. São quase 10 megawatts instalados, que respondem por 26% da produção de energia local, ou o suficiente para 2 mil famílias.

Outro trabalho criou uma central de aquecimento em um prédio público movido a pallets de madeira, obtidos a partir de árvores derrubadas em tempestades. Uma igreja e dois prédios comerciais se associaram à ideia e acabaram criando uma rede integrada de aquecimento de 700 metros que atende também a duas escolas, unidades esportivas e uma creche.

Para engajar ainda mais a população, há reuniões mensais. As crianças são envolvidas em projetos de educação ambiental em bases diárias, em que elas até aprendem a fazer cachorro-quente e muffins com o novo aquecimento, além de participarem da instalação dos painéis solares nas escolas.

Entre as linhas de atuação, a mais efetiva foi transformar um antigo campo de munições do Exército alemão em parque de bioenergia a 1,5 km da cidade. O local foi comprado com o prêmio de € 1 milhão. Parte da área de 900 mil metros foi remodelada para abrigar sete turbinas eólicas, cada uma com capacidade de gerar 3 megawatts. Os antigos bunkers de munição foram adaptados para receber painéis solares, que juntos têm a capacidade de gerar, no pico, 5,7 megawatts (ou o necessário para abastecer 1.700 casas). O investimento total, de cerca de € 70 milhões, veio de cooperativas e empresas locais, mas também de aportes dos habitantes.

Como a energia produzida é muito maior do que a utilizada na cidade, ela é repassada para um grid regional, que retorna em descontos de impostos e pagamento de renda para a cidade. O valor também é reinvestido em projetos.

No total, a cidade aponta que houve redução das emissões per capita em 42%, passando de 9,6 toneladas de CO2 por habitante em 2010 para 5,5 toneladas em 2014. E o custo de energia caiu 16%. “Podemos ver que funciona e teve resultado imediato em um ano de funcionamento. É bom para o clima, mas também bom por reduzir custos”, afirma Guido Wallraven, gerente dos projetos.

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